Marcelo Miranda / CEO da Consolis Tecnyconta

Enquanto o processo pode parecer complexo, a base da inovação é simples: resolver problemas. Ao longo das últimas décadas, a indústria da construção vem sendo pressionada a se reinventar para oferecer soluções aos seus conhecidos problemas.

Impactos ambientais, falta de previsibilidade de custos e prazos em suas entregas, processos antiquados, manuais e utilização de intensa mão de obra não qualificada são alguns dos desafios dessa indústria tão importante para a economia e o desenvolvimento da sociedade. Agora, esse cenário também precisa lidar com as exigências da pandemia de covid-19.

Em todo o mundo, enfrentamos restrições de mobilidade e dificuldades para dar continuidade às atividades com grandes concentrações de pessoas, inclusive os tradicionais canteiros de obras e os escritórios.

Essa crise acelerou processos e transformações na construção civil. Há uma clara exigência pela digitalização, mas não apenas isso. Vivemos uma busca pela “antifragilidade”, isto é, a necessidade de soluções que garantam maior previsibilidade em toda cadeia, mais certeza de entrega e de cumprimento de custos e cronogramas.

Por isso, é válido ressaltar a necessidade de entendermos as inovações da construção civil como peças fundamentais para nossa vida, especialmente no atual momento. Pois, diante dos impactos do novo coronavírus, fica evidente que as tendências da construção civil passam pela necessidade de promover segurança em todas as suas etapas.

Um dos pilares das transformações na construção civil é a construção pré-fabricada. Em vez de dezenas de atividades sendo realizadas simultaneamente por muitos trabalhadores em um canteiro de obra, a construção pré-fabricada representa uma produção de forma industrial e controlada de partes das edificações. Logo, a utilização de pré-fabricados pode significar, em média, uma redução de 50% a 70% na duração de uma obra. As indústrias que produzem pré-fabricados oferecem um ambiente industrial muito mais controlado e seguro, tanto na prevenção de acidentes, quanto no desafio de reduzir as multidões nos canteiros de obra.

A pré-fabricação é ainda uma das técnicas que traz controle e grande redução na geração de resíduos, além de permitir o uso de estruturas mistas, que unem o melhor de cada material e levam ao cliente final ganhos ainda maiores de performance e sustentabilidade.

Os “wearables” – dispositivos vestíveis – também podem trazer um grande avanço à construção civil, seja por aumentar a segurança do trabalho, seja para a geração de dados na busca de mais eficiência, como capacetes smart que permitem monitoramento de condições de saúde do trabalhador e de seu geoposicionamento, bem como óculos e roupas inteligentes que ajudam em diversas etapas do processo, trazendo dados importantes e mais segurança a todos.

O desenvolvimento de impressoras 3D de concreto para a produção de partes, ou até mesmo de toda a edificação, vem sendo testado projetos mundo afora. O uso ainda não está em larga escala, mas já podemos dizer que, ao lado da prefabricação, a impressão 3D tem tudo para acelerar e aumentar a eficiência na construção.

Investimentos em automação e robotização podem trazer velocidade e solução para tarefas repetitivas e complexas. A evolução dos processos que podem ser industrializados e automatizados na construção civil é um caminho natural para a atual dependência da mão de obra não qualificada do setor. A combinação dessa digitalização com a prefabricação tem se mostrado muito eficiente para integrar toda a cadeia do fornecedor ao cliente final, de uma forma muito mais colaborativa e racional.

Uma grande tendência nesse sentido são plataformas BIM (Building Information Modeling, ou Modelagem da Informação de Construção), que integram de forma colaborativa o projeto, a fabricação de peças, o orçamento, a montagem e todo o orçamento e gerenciamento dessa obra, em tempo real.

Outras inovações e tendências que já estamos observando na construção são os edifícios e materiais sustentáveis e inteligentes. Desde o projeto, passando pela execução e a manutenção, a construção busca evoluir seus edifícios para um menor consumo de recursos naturais, incluindo aqui a questão de gestão energética, desde a geração de energia limpa até o menor consumo.

O desenvolvimento contínuo de novas técnicas industriais e digitais para a construção tem trazido um ganho importante de competitividade ao setor da construção, o que permite oferecer moradias mais dignas à população mais necessitada economicamente, demonstrando como eficiência é igual a acesso social.

Muitas ferramentas digitais têm contribuído em várias etapas desse processo, desde o gerenciamento digital da logística, até a utilização de drones de monitoramento de áreas, processos, evoluções da obra etc. Por exemplo, podemos falar de instrumentos de realidade aumentada, como para a venda de um imóvel ou para a melhor visualização de detalhes em uma fábrica. Já smart sensors podem ser utilizados nas peças de concreto pré-fabricado para oferecer dados de movimento das estruturas por vibração das torcidas em um estádio, assim como ajudar a gerenciar a malhar de uma ferrovia.

Um dos principais desafios da indústria da construção nesse processo de transformação é conectar todas essas tendências de forma que volte a ser atrativa aos jovens trabalhadores. Hoje, com seu perfil repetitivo e sem especialização, a construção tradicional perdeu muito da atratividade que tinha há 20 ou 30 anos. Por isso, é preciso inovar para atrair talentos que ajudarão nessa transformação.

Tudo que favorece a experiência humana entra na evolução da construção civil. Aqui, falo da integração entre design e arquitetura com o objetivo de eficiência no uso das edificações e das cidades. Isso vai desde o design eficiente de uma maçaneta até o conceito cada vez mais explorado de smart cities, de cidades inteligentes, conectadas e sustentáveis. A revolução tecnológica não pode esquecer o fator humano, de experiência.

Tudo o que falei nesse artigo sobre tendências para a construção civil volta à minha primeira frase: a base da inovação é resolver problemas. Hoje, temos diversos problemas a serem enfrentados nas grandes cidades, a começar pelo mais emergencial, a covid-19. Por isso, considero tão relevante falarmos dessas tendências. Se para muitas empresas pareciam distantes, em um cenário de pandemia, elas podem ser ponto base dentro de suas reflexões e planos para a nova realidade.

As crises são momentos catalisadores de mudanças e vejo isso ganhando força também na indústria da construção. A combinação da digitalização em diversas escalas, a utilização eficiente de processos e tecnologias, o uso mais eficiente de materiais e recursos e um forte viés sustentável e social parecem ser a bola da vez para as empresas e líderes que estão puxando a fila dessa transformação sem volta.

Sobre Marcelo Miranda

Marcelo Miranda é o CEO da Consolis Tecnyconta na Espanha, filial espanhola do grupo multinacional francês Consolis, É um executivo reconhecido na criação de inovações que levam ao desenvolvimento sustentável.  Foi recentemente por 8 anos o CEO da Precon Engenharia. É Engenheiro Civil  pela UFMG, com MBA em Stanford e especializações em Harvard, Columbia e Singularity University. Faz parte da lista dos 10 CEOs de destaque do Brasil com menos de 40 anos pela Revista Forbes,  e foi eleito Executivo do Ano pela Revista Encontro em  2015. É conselheiro de empresas, da ABRH e do Capitalismo Consciente.