Artigo do Dr. Marcelo Campelo
Com a entrada em vigor do Código de Trânsito Brasileiro lá nos idos da década de noventa, uma nova visão dos crimes ocorridos quando se conduz um veículo ingressou no nosso sistema jurídico. As penas aumentaram drasticamente, bem como as multas para as infrações administrativas.
Quando se trata de infrações de trânsito, deve-se conceituar as espécies. Infrações administrativas são as multas aplicadas por descumprir a determinação de utilizar cinto de segurança, estacionar em local proibido, atravessar a via com um sinal vermelho. Nesses casos, haverá pagamento de multa, suspensão do direito de dirigir quando atingir os requisitos e comparecimento obrigatório nos cursos de reciclagem;
Já a obrigação de reparar após um acidente se trata de uma obrigação de natureza cível, no qual será averiguada a negligência, a imprudência e a imperícia do motorista que ocasionou o acidente e sua consequente obrigação de reparar. Na questão civil, a reparação dos danos causados é o foco do processo, na qual buscar-se-á apurar o quanto, em moeda, precisa ser pago para recompor o dano causado.
No Capítulo XIX, Seção II do Código de Trânsito são previstos os crimes de trânsito propriamente dito, desde homicídio, lesão corporal, embriaguez ao volante com as suas respectivas penas. Não há previsão de homicídio doloso nem dolo eventual, que conduzem o julgamento ao tribunal do júri.
Antes de ingressar na questão, é importante definir o que é crime doloso, dolo eventual e crime culposo. O crime doloso é quando o autor tem a vontade livre e consciente de produzir o resultado do crime. Exemplificativamente, o autor pega seu carro e atropela seu desafeto para matá-lo. O crime culposo é aquele em que o autor não quer o resultado, e por questões de negligência, imprudência e imperícia gera um resultado lesivo, por exemplo, atravessa uma preferencial, causa um acidente e o condutor do outro veículo vem a óbito. Quando se trata de dolo eventual precisa ser considerada a postura do autor em assumir um risco que pode levar ao acidente, exemplo, fazer um racha em via pública, dirigir embriagado, e nessas circunstância ocasionar a morte de outra pessoa.
As consequências processuais de um crime doloso, culposo e cometido mediante dolo eventual é caminho processual. Crimes culposos são julgados por um juiz singular, numa vara criminal comum ou especializada em crimes de trânsito como existe em Curitiba. Já os crimes dolosos contra a vida, homicídio, propriamente dito, são julgados perante o Tribunal do Júri. Agora, os crimes com dolo eventual, no qual o agente assume o risco de sua conduta, são julgados perante o Tribunal do Júri. Atualmente, a jurisprudência está mais firme neste sentido. Todavia, existe um ponto importante a ser mencionado: nossa Constituição prevê claramente e precisamente que irão a júri popular os crimes dolosos contra à vida, não os crimes com dolo eventual contra à vida.
A minha opinião pessoal é que direitos fundamentais, quando restringem direitos, devem ser interpretados restritivamente, portanto, se a Constituição não prevê a hipóteses do dolo eventual, por se tratar de uma restrição de direito, não cabe ao intérprete, os operadores do direito ampliar. Ademais, o juiz singular tende a ser mais rígido, mas por questões de política criminal e até para uma questão de prevenção geral, adotou-se tal posição.
Com isso, acidentes de trânsito que levam a óbito, em circunstância que demonstrem que o agente assumiu o risco do resultado morte, após a investigação, podem ser levados a julgamento pelo tribunal do júri.
Serviço: Dr. Marcelo Campelo
OAB 31366
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