Experiência, resiliência e os desafios trazidos pela pandemia
Por André Prevedel*
Nos últimos 20 anos, observei as mais diversas situações ao gerir equipes de tecnologia. Mas, mesmo tendo uma sólida bagagem prévia, nenhuma das minhas experiências chegou perto da crise que administramos com a pandemia do novo Coronavírus. Estruturar um planejamento em tempo recorde para executar ações complexas e de forma imediata, tais como prover home office para um número expressivo de colaboradores, blindar informações e realizar um controle efetivo das atividades - e tudo de forma a garantir a continuidade dos negócios e com o menor impacto possível -, foi não só um grande desafio, mas também o maior aprendizado que eu já vivenciei.
Tivemos que correr contra o tempo e fazer acontecer em poucos dias, ganhando velocidade e volume após a primeira quinzena de quarentena em São Paulo. E, mesmo sem um plano de contingência - afinal, ninguém sequer imaginava algo desta magnitude -, graças às alternativas que já desenvolvíamos para viabilizar o trabalho remoto tivemos impactos mínimos. Com as soluções que dispúnhamos, conseguimos colocar mais de seis mil colaboradores de nossas operações em modo remoto, e se não fosse o apoio dos nossos clientes, dificilmente teríamos dado conta da missão. Graças à solidez dos nossos relacionamentos e à coesão do nosso time de TI, seguimos em frente, vivenciando um desafio de cada vez.
Observando o nosso mercado, constatei que cada player encarou uma dificuldade diferente. É verdade que alguns agiram mais rápido, mas, agora, todos têm outra preocupação, tão latente quanto os desafios iniciais: literalmente pagar uma conta. Prover soluções para alocar colaboradores remotamente requer orçamento, capacidade de negociação e, tão importante quanto, poder de previsibilidade. Só que, por mais que os outros players tenham optado pelo apoio de fornecedores para o acesso às tecnologias sem um custo primário (e com pagamento entre 30 e 90 dias), quem poderia adivinhar que, mais de 120 dias depois, ainda estaríamos mantendo o isolamento? E, pior, com uma conta para pagar? Optamos por seguir a nossa estratégia, que pode ter demandado mais tempo em relação a outras empresas, mas que, no fim, nos possibilitou implementar uma solução flexível e de custo quase zero. Em outras palavras, nós tornamos a nossa ideia possível e por um preço bem menor; se nós viabilizássemos com o que o mercado nos oferecia para fazer essa virada rumo ao trabalho remoto, lá na frente eu teria uma conta absurda e, pior ainda, seria obrigado a oferecer uma contrapartida àqueles que nos ajudaram, devolvendo os equipamentos ou mesmo pagando as faturas.
Considerando que 70% das soluções tecnológicas que utilizamos são precificadas em dólar, e que isso traz a preocupação real em manter a saúde financeira, nosso poder de previsibilidade foi mais do que decisivo. Foi a nossa capacidade de vislumbrar os cenários que nos deu clareza para entender que, caso a pandemia persistisse (como, de fato, persistiu), poderia haver o desejo de renegociação de contratos por parte dos nossos clientes, o que certamente iria interferir na hora de fazer os cálculos. Agimos no timing correto e de maneira certeira. Demoramos um pouco mais? Sim. Mas acertamos, com tudo rigorosamente calculado para manter o azul em nossas contas.
Sou uma pessoa tranquila, e essa minha característica ajudou a segurar a pressão dos clientes em nossa equipe. Ao compartilhar a minha experiência com tranquilidade, e dando a todos um posicionamento claro e alinhado com os nossos clientes, conseguimos adotar soluções que, em alguns casos, podem não ter sido as mais perfeitas, mas, no fim da história, atenderam bem aos negócios deles.
Se a pandemia nos trouxe preocupações e a nossa resiliência nos deu credenciais para atravessar a pior das crises, o momento atual, de pura indefinição, nos mostra que os movimentos terão que ser bem calculados daqui para a frente. Teremos que buscar soluções inteligentes, sem persistir em erros do passado e, ao mesmo tempo, nos preparando para novas situações de colapso total. O mesmo vale para os nossos clientes: se eles perceberam que o relacionamento com os consumidores por outros canais é bom, que isso se perpetue! Mesmo que de forma comedida - ou a passos largos, mas sempre com muita perícia -, a transformação digital precisa acontecer. A realidade que vivenciamos agora é outra, e quem não se adequar certamente ficará para trás.
*André Prevedel é Chief Technology Officer da Neobpo