Fernanda Hickson*
Os outlets surgiram nos Estados Unidos na década de 1930 como uma forma despretensiosa de vender produtos com pequenos defeitos ou excedentes de produção diretamente das fábricas ao público, a preços reduzidos. Esse conceito inicial era simples, quase rudimentar, mas pavimentou o caminho para o primeiro outlet center formal em 1974, o Reading Outlet Center, na Pensilvânia. Esse modelo evoluiu significativamente, transformando-se em uma parte importante da cultura de consumo, não só nos EUA, onde há mais de 200 outlets atualmente, mas também globalmente. No entanto, o Brasil, embora com um potencial consumidor notável, ainda está engatinhando nesse setor.
Com apenas 17 outlets para uma população de 212 milhões de habitantes, o Brasil está muito atrás de outros países como os Estados Unidos e Itália, que têm proporções significativamente menores de habitantes por outlet. Esse atraso pode ser interpretado como um reflexo do conservadorismo do varejo brasileiro ou de uma adaptação lenta às novas tendências de consumo. Contudo, há sinais de uma expansão iminente. Até o final de 2024, o país deverá ter pelo menos dois novos outlets, aumentando a oferta e a diversidade de opções de compra para os consumidores brasileiros.
Os outlets no Brasil têm um papel que vai além de simplesmente oferecer descontos. Eles representam uma evolução no comportamento de consumo, na qual a experiência se torna um componente fundamental da compra. Localizados estrategicamente próximos a grandes metrópoles e rotas turísticas, esses centros funcionam como pontos de parada e destinos de compras que atraem consumidores não apenas pelas ofertas, mas também pelo ambiente e pelas experiências proporcionadas. A tendência é que os outlets se tornem espaços de convivência, com cinemas, áreas de lazer, restaurantes e eventos ao vivo, transformando o ato de comprar em algo mais envolvente e prazeroso.
O Brasil tem um histórico de forte cultura de consumo em shoppings centers, com centenas de estabelecimentos espalhados pelo país. No entanto, o outlet oferece uma proposta diferenciada, focada em marcas de prestígio e preços acessíveis. Isso gera uma competição saudável e, de certa forma, força os shoppings a se reinventarem para manter a fidelidade dos consumidores. O outlet, ao cortar intermediários e trazer o consumidor diretamente para o ambiente das marcas, proporciona uma relação mais direta, além de ajudar a desovar produtos que não foram vendidos nos varejos convencionais.
Esse modelo não só desafia o varejo tradicional, como também se adapta às necessidades de um consumidor mais informado e exigente. Segundo especialistas, a estratégia de marketing dos outlets mistura abordagens de venda direta e de branding que visam criar conexões emocionais com o público. A presença constante de promoções agressivas, como a famosa Black Friday, e a estrutura de lazer oferecida nos outlets contribuem para um fluxo constante de visitantes e compras. A experiência do cliente se torna, assim, o eixo central dessa nova forma de comércio, em que cada visita pode se transformar em uma história única de compra.
O consumidor brasileiro tende a abraçar essa ideia de compras com desconto, especialmente quando alinhada com experiências de qualidade. Os outlets oferecem uma alternativa viável para quem busca produtos de marca sem pagar o preço cheio, atraindo tanto consumidores habituais quanto turistas.
Assim, o futuro dos outlets no Brasil parece promissor, mas é preciso cautela e estratégia para expandir de forma sustentável. O desafio está em equilibrar a oferta com a demanda, garantindo que os outlets não percam seu apelo e se tornem apenas mais um formato de varejo saturado. O segredo talvez resida na capacidade de se adaptar continuamente às expectativas dos consumidores, oferecendo mais do que descontos: experiências que valem a viagem.
Com o tempo, os outlets brasileiros poderão se consolidar como uma força relevante no mercado, ajudando a redefinir a paisagem do consumo no país. Afinal, se há algo que a história dos outlets nos ensina é que, como em qualquer mercado, a capacidade de evoluir e se reinventar é essencial para sobreviver e prosperar.
*Fernanda Hickson é gerente de Marketing do City Center Outlet Premium.