Por Alcione Pereira, Fundadora e CEO da Connecting Food*

O Brasil é um dos países que mais desperdiçam alimentos no mundo. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), perdemos mais de 40 milhões de toneladas de comida por ano, o que equivale a 1,6% do nosso PIB. 

Para enfrentar o problema, o governo brasileiro tem lançado uma série de iniciativas nos últimos anos. Por exemplo, em 2020, foi aprovada a Lei nº 6214.016, que dispõe sobre o combate ao desperdício de alimentos e a doação de excedentes para o consumo humano. Ela não é abrangente o suficiente ainda, mas é um bom começo e outras medidas vêm sendo cobradas neste sentido. Por isso, espera-se que brevemente as doações de alimentos sejam uma prática mais razoável, em vez de as empresas terem que pagar para fazer isso, sendo mais caro doar do que jogar no lixo.

Além da legislação, o governo brasileiro também reativou, no início de 2023, o CONSEA, que se dedica às questões de insegurança alimentar grave, e também faz discussões fundamentais sobre abastecimento, incluindo o desperdício e a qualidade alimentar. Dessa forma, várias políticas públicas voltaram a ser colocadas em prática, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). 

Publicada no Diário Oficial em meados do ano passado, foi determinada a revisão da Estratégia Nacional de Perdas e Desperdício de Alimentos (PDA). Juntamente com a CAISAN (Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional), o objetivo é que o combate ao desperdício esteja orientado e culmine na ampliação do acesso da população a uma alimentação adequada e saudável.

Mas esses são problemas estruturais e multissetoriais, por isso, também vemos o envolvimento privado e da sociedade civil como um todo para reduzir os seus impactos. É o caso do surgimento de novas tecnologias desenvolvidas por foodtechs, por exemplo, além dos muitos projetos solidários e das coalizões empresariais, com destaque para o Movimento Todos à Mesa e o Pacto Contra a Fome.

Assim, vislumbramos algumas das tendências no combate ao desperdício de alimentos no Brasil para 2024:

  • Aumento da conscientização sobre o desperdício de alimentos, por meio de iniciativas lideradas por coalizões da sociedade civil unidas às governamentais.
  • Retomada da agenda e debates sobre o tema pelos governos federais e estaduais
  • Avanço da legislação, com melhorias no sistema fiscal relacionado às doações de alimentos e a adoção de políticas públicas para estimular a prevenção e a redução do desperdício de alimentos, incluindo incentivos fiscais para empresas que já trabalham nesse sentido e desenvolvem programas de doação e campanhas de conscientização.
  • Crescimento do mercado secundário de alimentos, que já vem aumentando nos últimos anos no Brasil (por exemplo, produtos próximos ao vencimento, mercadorias consideradas "feias" ou fora dos padrões estéticos de venda). Temos visto surgirem empresas e organizações que coletam, processam e distribuem alimentos que seriam desperdiçados e, como a quantidade é imensa, existe muito campo para este tipo de iniciativa se desenvolver mais e mais.
  • Adoção de diversas tecnologias, como o uso de câmeras e sensores para ajudar a identificar alimentos próximos da validade e que podem ser doados ou reaproveitados; sensores que detectam frutas e legumes maduros; sistemas de rastreamento de alimentos que permitem identificar os pontos críticos de desperdício; aplicativos que ajudam os consumidores a evitar o desperdício de alimentos; foodtechs que conectam doadores e OSCs, dentre outros.

Todas essas ações são importantes e, por que não dizer, imprescindíveis para reduzir o desperdício de alimentos no Brasil e contribuir para a segurança alimentar da população, sendo uma poderosa arma no combate à fome.